terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Ensino Fundamental de nove anos: Das orientações do MEC as ações dos Estados e Municípios





RESUMO

No ano de 2010 começou a vigorar a Lei nº 11.274/06, que sanciona o Ensino Fundamental de nove anos, tornando obrigatório o ingresso de crianças a partir dos seis anos de idade na escola, com o intuito de que as crianças, ao passarem mais tempo na escola, consigam um melhor desempenho acadêmico. O presente trabalho, por meio de pesquisa bibliográfica, em especial documentos do Ministério da Educação (MEC) e legislação específica sobre o tema da pesquisa, qual seja, o Ensino Fundamental de nove anos, e textos de autores do campo da educação como Batista (2006), Kramer (2009), Prada (2009) e Saveli (s/d), teve como objetivos estudar os documentos elaborados pelo MEC, a fim de caracterizar suas orientações com vistas à ampliação da duração do Ensino Fundamental. O problema da pesquisa assim se coloca: como deve ser o primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos, em seus aspectos estruturais e pedagógicos, tomando-o como transição entre a Educação Infantil e esta etapa de ensino. A pesquisa aponta que, apesar da proposta da ampliação do Ensino Fundamental ser boa, se sua implementação não for feita da forma adequada, em vez de se tornar um mecanismo para se obter um melhor rendimento escolar do aluno que frequenta a escola pública, ela se tornar uma violência contra os profissionais de educação e contra as crianças. No ano de 2010, a proposta manteve-se no plano discursivo, evidenciando um hiato significativo entre as orientações do MEC e o cotidiano das escolas da Rede Municipal de Educação de São Paulo.

Palavras-chave: Ensino Fundamental de Nove Anos. Reformas e Políticas Educacionais. Formação Continuada dos Profissionais da Educação.

ABSTRACT

In 2010 came into force Law No. 11.274/06, which sanctions the elementary school for nine years, making the entry of children as young as six years old at the school, in order that children, to spend more time in school, get a better academic performance. This paper, through literature, in particular documents of the Ministry of Education (MEC) and specific legislation on the subject of study, namely, the elementary school for nine years, and texts by authors from the field of education as the Baptist (2006), Kramer (2009), Prada (2009) and shad (s / d), aimed to study the documents prepared by the MEC in order to characterize their guidelines in order to expand the duration of the elementary school. The research problem thus arises: how should be the first year of elementary school for nine years, in their structural and educational aspects, taking it as transition between kindergarten and this stage of education. The research shows that despite the proposed expansion of the elementary school to be good, if its implementation is not done properly, instead of becoming a mechanism for achieving better academic performance of students who attend public school, she violence to become a professional education and against children. In 2010, the proposal remained at the discursive level, showing a significant gap between the directions of the MEC and the daily life of schools of the Municipal Education of Sao Paulo.


Keywords: elementary school for nine years. Educational Reforms and Policies. Continuing Education for Professional Education.


INTRODUÇÃO

A fim de melhorar as condições de equidade e qualidade na Educação Básica, ajudando as crianças a terem um melhor desempenho acadêmico em sua vida escolar, começou a vigorar, no ano de 2010, a Lei nº 11.274/06 que aumenta a duração do Ensino Fundamental de oito para nove anos, tornando obrigatório o ingresso de crianças a partir dos seis anos de idade na escola. Tal medida visa aumentar o tempo de permanência da criança na escola, uma vez que a Educação Infantil não é obrigatória como é o Ensino Fundamental, e grande parte das crianças das camadas populares só entram na escola aos sete anos de idade, dada a carência de vagas na Educação Infantil nas redes públicas de ensino.



A entrada de crianças de seis anos no Ensino Fundamental foi sinalizada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, embora como facultativo aos municípios e estados, Lei esta tida como mais democrática, comparativamente às LDBs anteriores – Leis 4.024/61 e 5.692/71 -, pois foi elaborada com a participação da sociedade civil e dos movimentos sociais, após o fim da ditadura militar. Embora a atual LDB tenha apontado a possibilidade de crianças de seis anos iniciarem o Ensino Fundamental, a prática foi adotada por alguns estados e municípios brasileiros, antes de se tornar obrigatório, em 2006, com prazo de implantação no ano de 2010.


Para que a implantação do Ensino Fundamental de nove anos acontecesse com sucesso em todas as escolas públicas do território nacional, e que o acolhimento e o trabalho a ser desenvolvido com as crianças de seis anos ocorressem respeitando-se as especificidades de seus processos de desenvolvimento e aprendizagem, que diferem do das crianças de sete anos, o MEC elaborou e encaminhou à rede e às Secretarias de Educação alguns documentos para subsidiar as tomadas de decisão para a transição do Ensino Fundamental de oito para nove anos.


É neste contexto que definimos os objetivos desta investigação: estudar os documentos do MEC que orientam a implantação do Ensino Fundamental de nove anos, documentos esses denominados “Ampliação do Ensino Fundamental para nove anos: relatório do programa”, “Ensino Fundamental de nove anos: passo a passo do processo de implantação” e “Ensino Fundamental de nove anos: orientações gerais”, bem como a Lei nº 11.274/06 que instituiu o Ensino Fundamental de nove anos, a fim caracterizar as ações recomendadas pelo MEC com vistas à implantação da ampliação desta etapa de ensino. Desta feita, o problema da pesquisa assim se coloca: como deveria ser organizada, do ponto de vista pedagógico e estrutural, o primeiro ano deste ensino, que passaria a acolher crianças de seis anos que antes frequentavam a última etapa da Educação Infantil?


A pesquisa é de natureza teórica, e esta ancorada no marco jurídico que trata do tema e, como já colocado, em documentos produzidos pelo MEC, tendo sido incorporado na revisão da literatura pesquisadores do campo da educação que têm se debruçado sobre a temática.


O interesse pelo tema surgiu no ano de 2009, quando atuei como estagiária bolsista em um dos Centros de Formação e Acompanhamento à Inclusão – CEFAI da Secretaria Municipal de Educação/São Paulo, tendo como função apoiar os professores em salas de aula onde houvesse alunos com necessidades educacionais especiais. No ano de 2010, ainda como estagiária, atuei em outra escola da Rede Municipal que, assim como a primeira escola, era jurisdicionada à DRE Capela do Socorro. A experiência possibilitou-me presenciar o processo inicial de implantação do Ensino Fundamental nas duas escolas municipais de São Paulo, pois estava na rede um ano antes da implantação e no ano de implantação, em 2010, conforme determinado por legislação do Conselho Nacional de Educação.


Na primeira escola, no ano de 2009, os profissionais estavam à espera de um posicionamento por parte da SME sobre como deveriam ser feitas tanto as adequações curriculares, e as adequações físicas do prédio escolar, inclusive esperavam ajuda financeira para as adaptações. Entre os professores havia certo receio de lidarem com crianças menores, pois nem todos tinham experiência na Educação Infantil. Alguns diziam terem optado em trabalhar com as crianças maiores do Ensino Fundamental e que não estavam felizes com a mudança.


Em fevereiro de 2010, na segunda escola, havia iniciado o trabalho alguns dias antes do começo do ano letivo. Nessa unidade escolar tomei conhecimento que a escola não havia recebido nenhuma verba para a reforma do prédio que iria receber crianças menores, e também nenhuma orientação de como começar a trabalhar com a nova turma de crianças com seis anos de idade. Com a proximidade dos professores, pude registrar que eles pareciam não diferenciar, de início, série e ciclo, com dificuldades para escolher, entre os livros enviados pela SME, o mais adequado à turma para ser trabalhado durante o ano letivo. Os professores perguntavam: “Este livro do quinto ano é para a quinta série atual ou para a turma da quarta série?” Alguns professores que trabalhavam em mais de uma escola diziam como a outra escola havia feito a escolha, para tentarem ajudar seus colegas a escolherem os livros.


No ano de 2010, essa escola arrumou o parque que já existia na unidade, e fez uma escala de revezamento entre os professores do primeiro ano para ser utilizado pelas crianças de suas classes, com apenas algumas horas na semana para uso pelas demais classes da escola. A professora da classe em que atuei entendia que seus alunos com nove anos precisavam também brincar, por isto, às sextas-feiras, reservava um tempo para seus alunos brincarem na última aula e, às vezes, os conduzia ao parquinho, mas sempre explicava que a prioridade de usar o parque era das crianças menores do primeiro ano.


Não houve rearranjo na disposição das carteiras das salas de aula para deixá-las mais adequadas às crianças com seis anos de idade, e continuaram enfileiradas. A coordenadora do CEFAI, supervisora do meu estágio, visitava as escolas da zona sul por conta do programa de inclusão, e disse-me que algumas escolas haviam feito com sucesso a adaptação curricular e física necessárias para receber as crianças menores, mais que foram muito poucas. Posteriormente, fui informada por um dos diretores do Sindicado dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo – SINPEEM, que por não ter havido orientação oficial da SME, cada escola fez o que pode para receber as crianças menores.


Em relação à formação dos professores para o atendimento das crianças de seis anos que ingressaram no Ensino Fundamental em 2010, o diretor do sindicato informou que cada DRE fez de um jeito, algumas no começo do processo, outras no final, e que teve DRE que não ofereceu nenhuma formação aos professores. A DRE da Capela do Socorro, encarregada das escolas nas quais estagiei, fez a primeira formação no mês de maio, quando foi abordado o tema do primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos, com somente mais dois encontros até o final daquele ano. Uma estagiária do CEFAI/DRE de Santo Amaro informou que os professores de sua escola receberam a formação sobre o processo de transição algumas semanas antes do ocorrido na região da Capela do Socorro.


Na sala dos professores havia sempre materiais no mural do SINPEEM e alguns exemplares de seu jornal, com matérias sobre a questão da implantação do Ensino Fundamental de nove anos, e sempre questionando a forma como estava sendo implantado na Rede. A falta de estrutura das escolas para receber as crianças menores e a falta de preparação dos professores para recebê-las estavam sempre presentes nas matérias do jornal e nas conversas entre os professores.


Por conta das vivências, como acima relatado, no primeiro momento da transição do Ensino Fundamental de oito para nove anos, comecei a estudar o tema em iniciação científica, no ano de 2009, retomando-o e aprofundando os estudos neste trabalho de conclusão de curso. No entanto, dada a recente obrigatoriedade do cumprimento da Lei, ainda não há estudos que apontem como o processo está ocorrendo, embora o que pude acompanhar, nos anos de 2009 e 2010, na maior metrópole do país, é um indicador do hiato entre a política pública e o chão da escola.


Quanto à organização do trabalho, o estruturamos em três capítulos. No primeiro capítulo denominado Ensino Fundamental de nove anos, há a descrição do que o MEC espera ampliando o Ensino Fundamental de oito para nove anos no Brasil, os marcos teóricos da Lei nº 11.274/06 e mostra outros países do mundo que trabalham com uma Educação Básica de maior duração. Para ajudar nesta reflexão são usados documentos do MEC, CNE, LDB, INEP e a contribuição dos autores Saveli, Zan, Cabral e Batista.


No segundo capítulo Primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos, são descritas as adaptações de conteúdo e horários pedagógicos, além da formação dos profissionais de educação, para trabalhar com as crianças de seis anos que ingressam na primeira série do Ensino Fundamental de nove anos. São trabalhados neste capítulo os documentos do MEC, SME, CEE, CNE, PCN, a LDB, junto com as contribuições dos autores Padua, Borba, Kramer, Nascimento, Goulart, Corsino, Luck, Veiga, Silva e Santos, Nery e Prada
No terceiro capítulo O Ensino Fundamental de nove anos na cidade de São Paulo, mostra-se como funciona a rede de educação na cidade e como foi o processo de discursão e implantação da Lei nº 11.274/06. São estudados as deliberações CEE 61/2006 e CEE 73/2008, a Lei n º 9394/96.



ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS

"A ampliação em mais um ano de estudo deve produzir um salto na qualidade da educação: inclusão de todas as crianças de seis anos, menor vulnerabilidade a situações de risco, permanência na escola, sucesso no aprendizado e aumento da escolaridade dos alunos." (BRASIL/MEC, 2004).

Um Ensino Fundamental com uma maior duração, com crianças entrando mais cedo na escola existe em muitos países no mundo. Na Europa alguns exemplos são a Suíça, onde “O ensino obrigatório, assim como no Brasil, inicia-se aos seis anos de idade e dura nove anos entre o Ensino Fundamental I (seis anos de duração, em média) e II (três anos de duração)...” (FDFA, 2009); na Dinamarca, onde “...4.Em agosto de 2009, a classe pré-primária foi tornada obrigatória para todos os alunos e, assim, um total de 10 years of education is compulsory, most frequently between the ages of 6 and 16. anos de escolaridade é obrigatória, mais frequentemente entre as idades de 6 e 16...”Most folkeskole (Fichas Dinamarca, 2009) e nainstitutions also offer a voluntary 11 Finlândia, onde “...A nova Lei da Educação Básica, que entrou em vigor em 01 de janeiro de 1999 ...peruskoulu (comprehensive school) into a lower and upper stage. afirma que a education lasts nine years and that, during the first six, instruction is usually given by the class Educação Básica durateacher and, in the last three, by the subject teacher (see class size/student grouping). nove anos...” (Fichas Finlândia, 2009).

Segundo Cabral (2006), a decisão do MEC de aumentar os anos de permanência das crianças no Ensino Fundamental, aproxima a realidade do Brasil à de outros países da América Latina, que já trabalham com uma Educação Básica de maior duração já há muitos anos:


[...] só nós e a Bolívia tínhamos ensino obrigatório de oito anos. Países como Argentina e Uruguai têm dez anos de ensino obrigatório, contando o ano final da pré-escola (aos 5 anos) e mais nove de educação básica. E o Chile recentemente incluiu o ensino médio como obrigatório, além dos oito anos de fundamental. (MARISA apud CABRAL, 2006, p. 1).



Batista (2006) acrescenta ainda que a diferença do Brasil em relação a outros países da América Latina, também se dá no que tange à idade de ingresso no ensino fundamental, pois nos outros países as crianças ingressam mais cedo na escola:


[...] o Brasil era o único país da América Latina cuja educação obrigatória se iniciava aos sete anos. Na maioria dos países latino-americanos (assim como da América do Norte e Europa), ela começa aos seis anos, embora as crianças argentinas, colombianas e equatorianas ingressem aos cinco (BATISTA, 2006, p. 1).


Apesar do destaque do Brasil na mídia internacional, como país referência na América Latina, a qualidade de seu ensino é considerada ruim por organismos internacionais. O jornal Estadão publica em janeiro de 2010 a matéria “Qualidade da educação no Brasil ainda é baixa, aponta UNESCO”, falando sobre o “Relatório de Monitoramento de Educação para Todos de 2010” organizado pela UNESCO, onde ele descreve que com os “índices de repetência e abandono da escola entre os mais elevados da América Latina, a educação no Brasil ainda corre para alcançar patamares adequados para um País que demonstra tanto vigor em outras áreas, como a economia”. O relatório aponta que a qualidade da educação no Brasil é baixa, principalmente na educação básica, e o nosso índice de repetência escolar não é só o mais elevado da América Latina, pois se o compararmos aos de outros países do mundo, a diferença se mostra ainda mais expressiva. A UNESCO acredita que “o Brasil poderia se encontrar em uma situação melhor se não fosse a baixa qualidade do seu ensino”, segundo consta no relatório.
Zan (2005) analisa se a expansão do Ensino Fundamental para nove anos no Brasil, não seria uma condição para nos igualarmos aos outros países da América Latina, que têm um tempo maior de escolarização. Esta também seria uma estratégia para conseguirmos inserção comercial mais significativa.


Possivelmente, essa iniciativa significaria uma ação no sentido de aproximação desses países, contribuindo assim para a consolidação do Mercosul. Acredito que são necessários estudos mais aprofundados para desvendar o caráter das orientações políticas que sustentam essa mudança no sistema de ensino brasileiro. (ZAN, 2005, p.1).


Seja visando a longo prazo bons acordos comerciais, ou pensando somente em garantir um direito, a ampliação do Ensino Fundamental de oito para nove anos precisa ser feita com responsabilidade e comprometimento do governo e de todos os envolvidos com a educação escolar.


Isto posto, neste capítulo, apresentamos iniciativas de âmbito federal, no que toca às ações desencadeadas pelo Ministério da Educação (MEC), para a implantação no país do Ensino Fundamental de nove anos de duração. Iniciativas que se referem não apenas ao aparato legal produzido após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ter sido sancionada, em 1996, mas também à produção de documentos orientadores dos sistemas de ensino e das escolas.


Ressalta-se, inicialmente, que as ações do MEC, em prol da ampliação da duração do Ensino Fundamental, datam de 2003, conforme revisão da literatura, e que, no ano de 2006, a ampliação foi instituída pela Lei nº 11.274, com prazo de implantação, em todo território nacional, até ano de 2010.

O tema tem mobilizado educadores, pesquisadores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental e a comunidade em geral, e parece não haver consenso sobre o mesmo. No mês de novembro, a título de exemplo, o jornal O Estado de São Paulo trouxe, em datas diferentes, duas matérias sobre o tema. A primeira, no dia 25, intitulada “Justiça libera menor de 6 anos no fundamental”, trata da decisão de um juiz de Pernambuco, justificada com a tese de “afronta ao princípio da isonomia, pois, segundo o juiz, as resoluções do Conselho Nacional deixam “que a capacidade de aprendizagem da criança individualmente considerada seja fixada de forma genérica e exclusivamente com base em critério cronológico”. Afirmou, ainda, que a faixa etária dos 6 anos para o início do Ensino Fundamental não se encontra em nenhum tipo de análise científica que indique que essa é a idade recomendada para as crianças iniciarem a alfabetização. O juiz recomenda que “o Estado deve se munir de meios para avaliar as crianças, por meio de comissões interdisciplinares, que levem em conta elementos psicopedagógicos, interações sociais, fatores socioambientais, entre outros, a fim de verificar se elas reúnem condições de avançar de fase de aprendizagem”.

A matéria afirma que a maneira como o Ensino Fundamental de nove anos foi implantada no país tem provocado polêmica entre gestores, educadores e pais. Há pais que têm recorrido à Justiça diante da negativa de colégios de fazer a matrícula de seus filhos no Ensino Fundamental, em cumprimento à legislação. Por sua vez, diretores escolares alegam que não podem desrespeitar a Secretaria de Educação.

A outra matéria, do dia 27 de novembro, traz a contestação das Escolas Waldorf à resolução do CNE que exige a matrícula de crianças de 6 anos na 1ª série, defendendo que as crianças devem iniciar o ensino fundamental aos 7 anos de idade, contrariando, portanto, decisões do CNE. As Escolas Waldorf estão questionando na Justiça as decisões desse Conselho. O jornal informa que, em meio à discussão, nesta semana, uma ação civil pública, do Ministério Público Federal no Distrito Federal, assim como ocorreu em Pernambuco, propôs o fim da resolução do CNE, com o argumento de que as redes devem ter autonomia.

A considerar o ano de 2010 como limite para o cumprimento das determinações do CNE, e, possivelmente, as pressões às escolas por quem cabe fiscalizar, acredita-se que outros pais devam recorrer à Justiça, em especial aqueles que mantêm seus filhos em escolas da rede privada.

Cabe, entretanto, percorrer parte do caminho traçado para a instituição do Ensino Fundamental de nove anos, pois este é o objetivo deste capítulo, e iniciamos com as disposições transitórias da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96 (LDB) que traz: “Cada Município e, supletivamente, o Estado e a União deverá matricular todos os educandos a partir dos sete anos de idade e, facultativamente, a partir dos seis anos, no ensino fundamental” (Art.87, §3º, inciso I). A Lei sinaliza, portanto, para a ampliação da escolaridade obrigatória, representando uma importante e progressiva conquista da sociedade brasileira em prol da escolarização de sua população na faixa etária de 6 a 14 anos; meta esta reiterada no Plano Nacional de Educação (PNE) 2001 – 2011, e instituída, finalmente, em 2006, pela Lei nº 11.274. Portanto, dez anos após a publicação da LDB atual, o Ensino Fundamental de nove anos foi instituído e teve suas Diretrizes Curriculares Nacionais fixadas pela Resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010 (BRASIL, 2010).

No que se refere aos marcos legais, uma das expressões da conquista referida, pode-se tomar a Lei 5692/71, que fixou as “diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus” no país, ampliando de quatro para oito anos a duração da escolaridade obrigatória, integrando o então ensino primário com o ginásio, que passou a ser denominado ensino de 1º grau. Essa extensão da escolaridade obrigatória representou uma tentativa de eliminação da histórica dualidade do sistema educacional brasileiro, nos termos de Souza (2008): “a lei atendia ao disposto na Constituição de 1967, eliminando, pelo menos formalmente, a concepção de ensino primário e ginasial, substituindo-a por uma escola integrada de educação fundamental” (p. 267). A histórica dualidade rompida formalmente, segundo a autora, refere-se à diferenciação social da cultura humanista e literária que predominava no currículo do ensino secundário com acesso de poucos, “tida como símbolo de classe e por isso disputada socialmente, gozando de status e prestígio” (p.290).

A LDB nº 9394/96 alterou a denominação de ensino de 1º grau para ensino fundamental, mantendo sua duração de oito anos; integrou na Educação Básica três etapas, a saber: a educação infantil, que tem “ como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade [...], a ser oferecida em creches, para crianças de até três anos de idade, e em pré- escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade” (Art.29); o ensino fundamental e o nível médio de ensino. Ressalta-se que foi a partir dessa Lei que a educação infantil passou a integrar o sistema nacional de educação, que até então estava vinculada à área da saúde e da assistência social.

Tematizar o Ensino Fundamental de 9 anos, como proposto neste trabalho, implica em ressignificar a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, percorrendo caminhos traçados no plano discursivo e nas ações desencadeadas no âmbito federal, assim como, trazendo elementos teóricos do debate entre pesquisadores e educadores das duas etapas de ensino.


No que toca à atuação do Ministério da Educação, sobre a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, tem-se que o mesmo:

[...] vem envidando efetivos esforços na ampliação do ensino fundamental para nove anos de duração, considerando a crescente universalização dessa etapa de ensino de oito anos de duração e, ainda, a necessidade de o Brasil aumentar o número de anos do ensino obrigatório (BRASIL, 2006, p.5).

Neste sentido, pontuamos, na sequência, as iniciativas do Ministério da Educação, por intermédio da Secretaria de Educação Básica, desencadeadas junto aos sistemas estaduais e municipais de ensino, a partir do ano de 2004. Naquele ano, foram promovidos sete encontros regionais, com a participação de 243 secretarias municipais de educação e 4 estaduais, com o objetivo de discutir a implementação da ampliação do Ensino Fundamental. As contribuições dos participantes possibilitaram a elaboração do documento Ensino Fundamental de Nove Anos – Orientações Gerais, publicado pela Secretaria de Educação Básica/MEC, em 2006, que se tornou “referência nacional para as questões pedagógicas, administrativas e de avaliação no que se refere à inclusão das crianças de seis anos no Ensino Fundamental” (BRASIL, 2004, s/p).

No relatório do Programa Ampliação do Ensino Fundamental para Nove Anos, criado pelo MEC em 2004, a sua responsabilidade pela orientação pedagógica e indução de políticas públicas para a educação é assumida, bem como justifica-se a iniciativa da ampliação:


No Brasil atual a universalização do Ensino Fundamental com duração de oito anos está praticamente consolidada, chegando a cerca de 97% das crianças . Isso permite que o Ministério da Educação planeje junto com estados e municípios o atendimento de outras necessidades sociais na educação, como incluir a população das faixas etárias não contempladas pelo Ensino Fundamental (BRASIL, 2004,s/p).


Afora justificativas de natureza social, os representantes das secretarias municipais e estaduais, participantes dos encontros regionais, apontaram aspectos de natureza pedagógica a serem considerados e incorporados nas discussões, quais sejam:

- Aprofundamento da concepção de infância, de alfabetização e letramento;
- Reestruturação da proposta pedagógica para o Ensino Fundamental de nove anos, com ênfase nas dimensões do desenvolvimento humano;
- Ênfase ao lúdico e ao brincar nas metodologias;
- Consideração do processo contínuo de aprendizado, orientando a progressão continuada nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental de nove anos;
- Redefinição da proposta político-pedagógica da Educação Infantil de zero a cinco anos;
- Definição de política de formação continuada em serviço envolvendo a esfera municipal, estadual e federal;
- Ampliação da discussão da política de inclusão das crianças com necessidades especiais;
- Definição de programas para correção da defasagem idade/série;
- Reavaliação do Programa Nacional do Livro Didático, com vistas à nova estrutura do Ensino Fundamental de nove anos;
- Realização de discussões mais efetivas sobre as classes multisseriadas e educação no campo (BRASIL, 2004, s/p).


Tem-se, assim, na proposta e orientações elaboradas pelo MEC, a compreensão da ampliação não apenas como uma medida administrativa, pois a atenção volta-se para o processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças, implicando, portanto, no conhecimento e respeito às características etárias, sociais, psicológicas e cognitivas da criança de 6 anos de idade no Ensino Fundamental, como afirmado no documento.


À época, o MEC apontou a necessidade de regulamentação do Ensino Fundamental de nove anos, tornando-o obrigatório a fim de se evitar dupla modalidade, internamente, no mesmo sistema de ensino, ou entre os sistemas estadual e municipal. Essa regulamentação, como já colocado, ocorreu dois anos após com a aprovação da Lei nº11.274/2006, quando o MEC assim se manifestou:


[...] mais crianças serão incluídas no sistema educacional brasileiro, especialmente aquelas pertencentes aos setores populares, uma vez que as crianças de seis anos de idade das classes média e alta já se encontram, majoritariamente, incorporadas ao sistema de ensino – na pré-escola ou na primeira série do ensino fundamenta (BRASIL, 2006, p.5).


No mesmo documento, o MEC aponta para outro fator que justifica a inclusão das crianças de seis anos na instituição escolar, que são os resultados de estudos que assinalam que o ingresso da criança antes dos sete anos de idade, implica, em sua maioria, em resultados escolares superiores quando comparados às crianças que ingressam apenas aos sete anos. Como exemplo, cita resultados do SAEB (2003), cujas crianças com históricos de experiência na pré-escola obtiveram médias superiores de vinte pontos nos testes de leitura, comparadas às crianças sem essa experiência.


Ao regulamentar a ampliação, definiu-se como prazo para a sua implantação o ano de 2010, quando os sistemas já deveriam tê-lo planejado e organizado, garantindo às crianças vagas e infraestrutura adequada, dentre outros, com a devida orientação do MEC, quanto às mudanças necessárias para a implementação pelos sistemas estaduais e municipais.

PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS: AÇÕES DO MEC

Na introdução do documento Passo a Passo do Processo de Implantação (Brasil, 2009, 2ª ed.), reafirma-se o direito público subjetivo do Ensino Fundamental e os objetivos da ampliação desta etapa de ensino para nove anos de duração, conforme seguem:


a) melhorar as condições de equidade e de qualidade da Educação Básica; b) estruturar um novo ensino fundamental para que as crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de escolaridade; c) assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças tenham um tempo mais longo para as aprendizagens da alfabetização e do letramento (p.5).

Outra razão para a ampliação do Ensino Fundamental de oito para nove anos, apontada no documento, é assim colocada:


Com a aprovação da Lei no 11.274/2006, mais crianças serão incluídas no sistema educacional brasileiro, especialmente aquelas pertencentes aos setores populares, uma vez que as crianças de seis anos de idade das classes média e alta já se encontram, majoritariamente, incorporadas ao sistema de ensino – na pré-escola ou na primeira série do ensino fundamental (BRASIL, 2006, p. 5).


Posição que é compartilhada por Savelli (2009), pois defende que as crianças dos setores populares, ao entrarem mais cedo na escola, desfrutando de um ano a mais no Ensino Fundamental, terão mais chances de ser bem sucedidas academicamente.


[...] a inserção da criança das classes populares mais cedo na escola obrigatória permite a mesma uma familiarização mais precoce com um universo cultural mais amplo o que possibilita melhores condições para o seu aprendizado da leitura e da escrita [...] (SAVELI, 2009, p.1).


Para Zan (2005), assim como para a autora acima, as maiores beneficiadas com o aumento da duração do Ensino Fundamental de oito para nove anos serão as crianças de famílias de classes populares, pois as crianças de famílias de classe média e alta, desde os seis anos, já se encontram na pré-escola ou no ensino fundamental.


[...] um número significativo de crianças com essa idade, filhas de famílias das classes média e alta, já se encontram inseridas no mundo escolar, seja na pré-escola ou no ensino fundamental (Brasil, 2005), o que difere da realidade da maior parte das crianças brasileiras dessa mesma faixa etária [...] (ZAN, 2005, p. 1).


Sabe-se que as vagas para atender a demanda desta etapa da Educação Básica são criadas conforme a pressão da demanda, o que faz com que muitas mães precisem recorrer ao Conselho Tutelar e mesmo a entrar com processo na Justiça, para conseguir um lugar para matricular seu filho. A Educação Infantil é um direito da criança, fazendo parte da escolarização básica, conforme traz o Conselho Nacional de Educação (CNE) - Resolução nº 4 de 13 de julho de 2010, que trata das Diretrizes Curriculares para a Educação Básica -, ao descrever quais são as etapas em que o desenvolvimento educacional acontece:


Art. 21. São etapas correspondentes a diferentes momentos constitutivos do desenvolvimento educacional:


I - a Educação Infantil, que compreende: a Creche, englobando as diferentes etapas do desenvolvimento da criança ate três (três) anos e 11 (onze) meses; e a Pré-escola, com duração de 2 (dois) anos;
II - o Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, com duração de 9 (nove) anos, e organizado e tratado em duas fases: a dos 5 (cinco) anos iniciais e a dos 4 (quatro) anos finais;
III - o Ensino Médio, com duração mínima de 3 (três) anos (BRASIL, 2010).


É neste contexto educacional que se insere a Lei nº 11.274/06, que foi proposta como um mecanismo legal para a ampliação do acesso à educação obrigatória, tornando o Estado responsável em fornecer escolarização às crianças de seis anos.

Retomando o documento Passo a Passo do Processo de Implantação, o MEC informa que o mesmo foi elaborado com o objetivo de subsidiar não só os gestores municipais e estaduais, mas também os conselhos de educação, a comunidade escolar e demais órgãos e instituições (p.5). Apresenta a seguinte estrutura: normatização, que traz as bases legais que sustentam a medida, com subdivisões relativas às normas e orientações ao Conselho Nacional de Educação, Conselho Estadual de Educação, Secretaria Estadual ou Municipal de Educação e às escolas; organização pedagógica, que aborda aspectos relativos ao currículo, ao projeto pedagógico das escolas, à avaliação e formação dos profissionais da educação.


Na sequência, abordaremos os pontos por nós considerados relevantes para a compreensão das medidas necessárias para a implantação da ampliação, considerando os diferentes âmbitos de responsabilidade definidos pelo MEC.

No que toca às competências dos Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, cabe-lhes, de acordo com as normas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação, definir as normas e orientações gerais quanto à reorganização administrativa (alterações na documentação escolar, redimensionamento de pessoal, condições de infraestrutura, adequação e aquisição de mobiliário e de equipamentos), e à reorganização pedagógica (formação dos profissionais da educação; período reservado a estudos, planejamento e avaliação; reorganização dos tempos e espaços escolares; garantia da obrigatoriedade dos estudos de recuperação; adequação e aquisição do material didático e redimensionamento da Educação Infantil). O MEC ressalta que as tomadas de decisões pelos Conselhos, consubstanciadas em um documento legal, deve ser publicado no Diário Oficial respectivo e outros veículos de comunicação, “além de serem instrumentos de mobilização das escolas e da comunidade escolar por meio de reuniões, seminários, distribuição de folder, etc.” (BRASIL, 2009, p.10). Assim, a participação ativa da escola e da comunidade foram previstas, fato que sinaliza como relevante, pois, em última instância, qualquer medida que interfere no chão da escola e no cotidiano dos docentes e dos alunos deve, necessariamente, valorizar a participação dos docentes, assim como da comunidade.

A atualização da proposta pedagógica é colocada no documento como de competência das Secretarias Estaduais ou Municipais de Educação, cabendo-lhes coordenar debates aprofundados sobre: a proposta em si, a formação de professores, as condições de infraestrutura e os recursos didático-pedagógicos apropriados, bem como sobre a organização dos tempos e espaços escolares. Para o MEC são imprescindíveis ações que contemplem todos os aspectos citados acima, reafirmando ser responsabilidade de cada sistema a reflexão, os estudos e debates democráticos sobre a temática. O Plano de Implementação do novo Ensino Fundamental adotado deve ser regulamentado e, para que isto ocorra, deve haver uma articulação entre as Secretaria de Educação e os Conselhos de Educação. As orientações normativas e pedagógicas para a construção do plano referido, conforme assinala o MEC, encontram-se nos Pareceres nº 06/2005 e 04/2008, sendo necessário constar no mesmo:


- estudo da demanda de matrículas no ensino fundamental;
- planejamento da quantidade de turmas no ensino fundamental;
- o redimensionamento da educação infantil, sem prejuízos em sua oferta e qualidade, bem como a preservação de sua identidade pedagógica;
- redimensionamento do espaço físico;
- reorganização do quadro de professores, se necessário;
- formação inicial e continuada de professores e demais profissionais da educação;
- adequação e aquisição de mobiliário e equipamentos;
- adequação e aquisição de material didático-pedagógicos;
- garantia de transporte e merenda escolar;
- reorganização administrativa para a escola e a secretaria de educação;
- processos de avaliação, em especial para o ciclo da infância, qual seja, os três primeiros anos da etapa do ensino fundamental (BRASIL, 2009, p.11).

As adequações, sejam elas de natureza administrativa ou pedagógicas, devem orientar-se por princípios a serem observados pelos sistemas de ensino e pelas escolas, que se referem à promoção da autoestima dos alunos no período inicial de sua escolarização; o respeito às diferenças e às diversidades no contexto do sistema nacional de educação; cuidar para que as medidas não representem um retrocesso no sentido de produzir o indesejável fracasso escolar e tratamento diferenciado ao aluno em seu processo de aprendizagem, se necessário for, requerendo dos gestores bom senso nas medidas colocadas em ação (BRASIL, 2009, p.13).

Uma questão polêmica diz respeito à idade de corte para a matrícula do aluno no ensino fundamental de nove anos. No documento, aponta-se que “é a partir dos seis anos de idade, completos ou a completar até o início do ano letivo”(p.13), afirmação genérica e vaga, cuja especificação é trazida nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos, fixadas pela Resolução nº 7/2010.

Art. 8º O Ensino Fundamental, com duração de 9 (nove) anos, abrange a população na faixa etária dos 6 (seis) aos 14 (quatorze) anos de idade e se estende, também, a todos os que, na idade própria, não tiveram condições de frequentá-lo.
§ 1º È obrigatória a matrícula no Ensino Fundamental de crianças com 6 (seis) anos completos ou a completar ate o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula, nos termos da Lei e das normas nacionais vigentes.
§ 2º As crianças que completarem 6 (seis) anos após essa data deverão ser matriculadas na Educação Infantil (Pré-Escola).

Como colocado no início deste capítulo, a polêmica está instalada, no que diz respeito à idade de corte e, possivelmente a mobilização dos pais tende a se intensificar.

Quanto à organização pedagógica, mais especificamente o currículo, as escolas que, no ano de 2007, já haviam ampliado o ensino fundamental para nove anos de duração receberam do MEC a publicação “Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações pedagógicas para a inclusão das crianças de seis anos de idade”, uma coletânea composta por nove textos elaborados por especialistas. Ressalta-se que, conforme o Censo Escolar de 2003, 11.510 escolas públicas brasileiras, de um total de 159.861 escolas, já haviam ampliado o Ensino Fundamental para nove anos (BRASIL, 2004, s/p.). No início do ano de 2009, todas as escolas públicas brasileiras e as secretarias de educação receberam uma outra publicação, constituída por cinco cadernos intitulados “Indagações sobre Currículo, cada um deles abordando um tema referente ao currículo. São documentos, conforme o MEC, de orientação pedagógica às escolas, cujo objetivo é subsidiar discussões sobre currículo escolar, pois “[...] um novo Ensino Fundamental requer um currículo novo [...]” (BRASIL,2009, pp.14 e 15).

As iniciativas do MEC, em âmbito nacional, se deram no sentido de deflagar nas escolas e nos sistemas de ensino debates sobre a concepção de currículo e seu processo de elaboração, possibilitando reflexões sobre seus eixos organizadores, concepção curricular, análise e elaboração das propostas curriculares dos sistemas de ensino e dos projetos pedagógicos das escolas, fortalecimento da escola como espaço do conhecimento, do convívio e da sensibilidade, e, ainda, reflexões sobre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental de nove anos, no que toca às suas diretrizes curriculares nacionais.

Considerando o que pude experienciar, como estagiária, nos anos de 2009 e 2010, em duas escolas da Rede Municipal de São Paulo, as iniciativas do MEC não repercutiram nas escolas.

Ainda sobre a organização pedagógica, o documento enfatiza que cada escola requer um projeto pedagógico próprio, e assinala para a relevância da ressignificação da avaliação da aprendizagem.

Assim, recorrendo ao Parecer CNE/CEB nº 4/2008, esse reafirma que o processo de avaliação deve considerar, de forma prioritária, que os três anos iniciais constituam-se em um período destinado à construção de conhecimentos que solidifiquem o processo de alfabetização e de letramento. Portanto os procedimentos de avaliação devem acompanhar a necessidade de se trabalhar pedagogicamente nesses 3 anos para o desenvolvimento das diversas formas de expressão das crianças (BRASIL, 2009, p.17).


O que se propõe para os três anos iniciais, conforme o Art. 30 das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos (BRASIL, 2010), é que esses três anos devem assegurar:


I – a alfabetização e o letramento;
II – o desenvolvimento das diversas formas de expressão, incluindo o aprendizado da Língua Portuguesa, a Literatura, a Música e demais artes, a Educação Física, assim como o aprendizado da Matemática, da Ciência, da História e da Geografia;
III – a continuidade da aprendizagem, tendo em conta a complexidade do processo de alfabetização e os prejuízos que a repetência pode causar no Ensino Fundamental como um todo e, particularmente, na passagem do primeiro para o segundo ano de escolaridade e deste para o terceiro.
§ 1º Mesmo quando o sistema de ensino ou a escola, no uso de sua autonomia, fizerem opção pelo regime seriado, será necessário considerar os três anos iniciais do Ensino Fundamental como um bloco pedagógico ou um ciclo sequencial não passível de interrupção, voltado para ampliar a todos os alunos as oportunidades de sistematização e aprofundamento das aprendizagens básicas imprescindíveis para o prosseguimento dos estudos.


Tem-se, assim, um avanço na compreensão da relevância principalmente dos três anos iniciais do Ensino Fundamental, recomendando- se que o mesmo seja considerado como um ciclo sequencial, não passível, portanto, de reprovação. No entanto, cabe pontuar que o texto deixa em aberto a possibilidade de isto não acontecer, pois afirma que “será necessário considerar”, correndo-se o risco dos sistemas que fizeram a opção pela organização seriada ignorarem a recomendação.


ADAPTAÇÃO DO CONTEÚDO PEDAGÓGICO E DA ROTINA ESCOLAR

O aumento do tempo de permanência do aluno no espaço escolar, acrescentando-se mais um ano ao Ensino Fundamental, não se reverterá em melhor desempenho acadêmico a longo prazo, se o tempo que ele passa dentro da escola não for estruturado para atendê-lo em suas especificidades, fazendo-o avançar. Na introdução do documento Ensino Fundamental de nove anos: orientações gerais, tem-se a seguinte ponderação:


Ressalte-se que a aprendizagem não depende apenas do aumento do tempo de permanência na escola, mas também do emprego mais eficaz desse tempo: a associação de ambos pode contribuir significativamente para que os estudantes aprendam mais e de maneira mais prazerosa [...] (BRASIL,2006, p. 9).


Esta constatação de que não basta somente aumentar o tempo de permanência do aluno não espaço escolar, para que ele obtenha bons resultados acadêmicos, sendo necessário se fazer adaptações na escola para recebê-lo de forma adequada, proporcionando-lhe condições de desenvolvimento, aparece em outro documento do MEC, Ensino Fundamental de nove anos: passo a passo do processo de implantação:


A organização do novo Ensino Fundamental com nove anos de duração e, consequentemente da proposta pedagógica, implica na necessidade imprescindível de um debate aprofundado sobre essa proposta, sobre a formação de professores, sobre as condições de infra-estrutura e sobre os recursos didático-pedagógicos apropriados ao atendimento e o essencial: a organização dos tempos e espaços escolares e tratamento, como prioridade, o sucesso escolar. (BRASIL, 2009, p. 11).

No ano de 2010, quando o Ensino Fundamental de nove anos entrou em vigor e as escolas tiveram por obrigatoriedade receber crianças de seis anos, muitas eram as dúvidas de como adaptar currículo e o espaço físico para recebê-las com respeito. Estas dúvidas já existiam ha muitos anos, desde que se pensou em aumentar um ano na escolarização básica, como aponta o documento Ampliação do Ensino Fundamental para nove anos: relatório do programa: “[...] Os processos educativos precisam ser adequados à faixa etária das crianças ingressantes para que a transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental aconteça sem rupturas traumáticas para elas” (MEC, 2004, p. 3). Dúvidas de como deveria ser este novo Ensino Fundamental eram pertinentes, por que:


O Ensino Fundamental ampliado para nove anos de duração é um novo Ensino Fundamental, que exige uma proposta pedagógica própria para ser desenvolvida em cada escola (Parecer CNE/CEB n° 4/2008). Portanto, um novo Ensino Fundamental requer um currículo novo [...] (BRASIL, 2009, p. 14).

Com a mudança do Ensino Fundamental, a escola que é um organismo vivo, refletindo a sociedade na qual está inserida, deveria ser reformulada para receber as crianças de seis anos, que outrora frequentavam a Educação Infantil, tornando-se como diz Saveli “[...] uma escola para a Infância onde nossas crianças possam conviver em um espaço escolar em que os afetos, as brincadeiras, os saberes, os valores enfim, a seriedade e o riso estejam presentes” (SAVELI, 2009).


É necessário adaptar as escola em seu conteúdo pedagógico e rotinas escolares, para trabalhar no primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos, de forma a atender adequadamente as necessidades das crianças de seis anos de idade, que são diferentes das crianças de sete anos por não possuírem o mesmo desenvolvimento físico, cognitivo e emocional destas, pois como consta no documento Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações gerais, “[...] O desenvolvimento do aluno é a principal referência na organização do tempo e do espaço da escola.” (MEC, 2004, p. 13). Tais mudanças precisam ser discutidas e feitas com muito cuidado, respeitando-se as especificidades das crianças menores, como consta do mesmo documento:


[...] não se trata de transferir para as crianças de seis anos os conteúdos e atividades da tradicional primeira série, mas de conceber uma nova estrutura de organização dos conteúdos em um Ensino Fundamental de nove anos, considerando o perfil de seus alunos. (BRASIL, 2004, p. 17).



A antecipação de conteúdos sem levar em conta o aluno atendido, principalmente quando o aluno em questão são crianças muito pequenas como as de seis anos, é uma violência. Os próprios Parâmetros Curriculares Nacionais preveem que a adequação pedagógica ocorra quando necessária, pois:


[...] adaptações resguardam o caráter de flexibilidade e dinamicidade que o currículo escolar deve ter, ou seja, a convergência com as condições do aluno e a correspondência com as finalidades da educação na dialética de ensino e aprendizagem [...] (BRASIL,1998, p. 16).


Também, sobre a importância de se adaptar a escola para trabalhar com crianças menores, temos no livro de textos elaborado pelo MEC Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a inclusão das crianças de seis anos de idade, a seguinte posição:


“O modo como organizamos o trabalho pedagógico está ligado ao sentido que atribuímos à escola e à sua função social; aos modos como entendemos a criança; aos sentidos que damos à infância e à adolescência e aos processos de ensino-aprendizagem [...]” (GOULART, 2006, p. 88).

A necessidade de se adaptar a escola, principalmente o primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos que receberá crianças de seis anos, se baseia em estudos como os de Jean Piaget, que foi um epistemólogo suíço considerado o um dos mais importantes pensadores do século XX, estudioso do desenvolvimento infantil e da cognição humana. Ele descobriu em seus estudos que as crianças amadurecem e se desenvolvem ano após ano e, por isso, crianças de seis e sete anos que se encontram em fases diferentes de maturação física, não podem ser ensinadas da mesma maneira. As operações mentais que uma criança de sete anos consegue fazer com certa facilidade, são muito complexas para uma criança de seis anos.


Do nascimento até aproximadamente dois anos de idade a criança se encontra no estágio sensório-motor, atingindo um nível de equilíbrio por volta dos 12 - 18 meses. Terminado este período, ela adentra no estágio pré-operatório e permanece nele até completar mais ou menos 7 - 8 anos, sendo que o equilíbrio é atingido quando a criança está com a idade de 4 - 5 anos. Superado esses dois, começa-se a jornada pelos dois outros estágios - os operatórios. O primeiro deles é o concreto que se inicia ao final do segundo estágio e tem duração, em média, até os 11 - 12 anos. O nível de equilíbrio acontece aos 9 - 10 anos. O último estágio - o operatório formal que inicia ao final do terceiro e no qual o ser humano permanece por toda a vida adulta atinge um estado de equilíbrio por volta dos 14 – 15 anos de idade. Piaget ressalta que "estas idades médias dependem dos meios sociais e escolares". (PADUA, 2009, p. 34)


Levando em consideração os estudos de Jean Piaget, Vygotsky e Wallon, compreende-se que o primeiro ano deste novo Ensino Fundamental deve ser uma adaptação, uma transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental, uma vez que cada etapa de ensino resguarda suas especificidades e deve se adequar ao desenvolvimento físico, cognitivo e emocional que é diferente entre as crianças de seis e sete anos. Portanto, não se pode trabalhar da mesma forma e com os mesmos conteúdos com as crianças menores, pura e simplesmente passando o conteúdo de primeira série do Ensino Fundamental de oito anos, destinado a crianças de sete anos. A indagação dos profissionais de educação do que trabalhar no primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos, aparece no documento do MEC Ensino Fundamental de nove anos: passo a passo do processo de implantação:


O conteúdo do primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos é esmo conteúdo trabalhado no primeiro ano/primeira série do Ensino Fundamental de oito anos?


Não. Pois não se trata de realizar um “arranjo” dos conteúdos da primeira série do Ensino Fundamental de oito anos. Faz-se necessário elaborar uma nova proposta político-pedagógica e curricular coerente com as especificidades não só da criança de seis anos de idade, como também das demais crianças de sete, oito, nove e dez anos de idade que realizam os cinco anos iniciais do Ensino Fundamental, assim como os anos finais dessa etapa de ensino. (BRASIL, 2009, p. 24).

Em consonância com as orientações do documento acima citado, tem-se a posição de estudiosos da educação, como segue:


Nossa experiência na escola mostra-nos que a criança de seis anos encontra-se no espaço de interseção da educação infantil com o ensino fundamental... É importante que não haja rupturas na passagem da educação infantil para o ensino fundamental, mas que haja continuidade dos processos de aprendizagem [...] (GOULART, 2006, p. 89).

No mesmo livro de texto, tem-se Kramer, para quem “educação infantil e ensino fundamental são frequentemente separados. Porém, do ponto de vista da criança, não há fragmentação [...] acrescentando que “educação infantil e ensino fundamental são Indissociáveis [...]. Na educação infantil e no ensino fundamental, o objetivo é atuar com liberdade para assegurar a apropriação e a construção do conhecimento por todos (KRAMER, 2006, pp .21 e 22).


Para as autoras, cada uma das etapas da educação básica tem características próprias, mas não deve haver uma ruptura drástica do modo de trabalhar da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. Nas escolas, deixar uma etapa para ingressar em outra acaba sendo algo traumático para a criança, por isso o primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos deve ser uma espécie de junção entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental (KRAMER; GOULART, 206).


Quando a criança ingressa no Ensino Fundamental sua rotina muda, como se ela não fosse mais uma criança com necessidades especificas, e costumeiramente a criança sai da Educação Infantil onde brincar era valorizado, para o Ensino Fundamental onde estudar é um trabalho sério (BORBA, 2006). Sobre essa brusca ruptura da forma de ensinar, Borba questiona: ”Por que à medida que avançam os segmentos escolares se reduzem os espaços e tempos do brincar e as crianças vão deixando de ser crianças para serem alunos? (BORBA, 2006, p.35).



Nascimento ao analisar a importância da brincadeira para as crianças menores, como algo que ajuda na formação no seu desenvolvimento biológico, emocional e social e que portanto devem estar presente no cotidiano escolar, faz a seguinte colocação:
Pensar sobre a infância na escola e na sala de aula é um grande desafio para o ensino fundamental que, ao longo de sua história, não tem considerado o corpo, o universo lúdico, os jogos e as brincadeiras como prioridade. Infelizmente, quando as crianças chegam a essa etapa de ensino, é comum ouvir a frase “Agora a brincadeira acabou!” (NASCIMENTO, 2006. p. 32).


A primeira série de transição da Educação Infantil para o Ensino Fundamental deveria priorizar práticas pedagógicas como o trabalho em grupo, comum na Educação Infantil e que quase não acontece no Ensino Fundamental, que tradicionalmente coloca o aluno para trabalhar sozinho sentado em carteiras enfileiradas e as salas de aula também deveriam ter os cantinhos da Educação Infantil, pois “Na prática pedagógica, a estética dos espaços, dos materiais, dos gestos e das vozes dá visibilidade ao que e como se propõe à criança e, ainda, ao que o adulto pensa sobre ela e sobre a educação dirigida a ela” (CORSINO, 2006, p. 69). O aluno que ingressa no Ensino Fundamental não deixa de ser uma criança, ser biológico de pouca idade e em desenvolvimento, que precisa de cuidados especiais e rotina diferenciada de um aluno de mais idade.


Para Goulart “Pensar na organização da escola em função de crianças das séries/anos iniciais do ensino fundamental, com ênfase nas crianças de seis anos, envolve concebê-las no sentido da inserção no mundo letrado” (GOULART, 2006, p. 91). No documento Ensino Fundamental de nove anos: passo a passo do processo de implantação, organizado pelo MEC, consta entre as perguntas mais frequentes dos profissionais da educação, como deve ser a alfabetização no primeiro ano do Ensino Fundamental de nove anos:

No Ensino Fundamental de nove anos, o primeiro ano se destina exclusivamente à alfabetização?

Esse primeiro ano constitui uma possibilidade para qualificar o ensino e a aprendizagem dos conteúdos da alfabetização e do letramento. Mas, não se deve restringir o desenvolvimento das crianças de seis anos de idade exclusivamente à alfabetização. Por isso, é importante que o trabalho pedagógico assegure o estudo das diversas expressões e de todas as áreas do conhecimento (BRASIL, 2009, p. 23).

Para se receber as crianças menores na primeira série do Ensino Fundamental com respeito, muitas coisas precisam ser mudadas na escola. Um bom acolhimento escolar é um direito da criança enquanto cidadã de direitos, como o documento do MEC Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações gerais, aponta:

[...] considerar a especificidade da faixa etária das crianças significa reconhecê-las como cidadãs e, portanto, como possuidoras de direitos, entre eles educação pública de qualidade, proteção e cuidado por parte do poder público. (BRASIL, 2004, p. 22).

Cientes disto, todas as adaptações necessárias, tanto pedagógicas como estruturais, assim como a formação continuada dos profissionais que vão trabalhar com ela, devem ser feitas.

FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO

Para que a implantação do Ensino Fundamental de nove anos ocorra de forma adequada, resultando em ganho acadêmico para a criança atendida, outro ponto crucial é a formação continuada dos profissionais que irão lidar com estas crianças menores, especialmente os professores, porque como salienta a educadora Luck:


Entende-se que a questão do desenvolvimento da qualidade de ensino demanda uma orientação mais global e abrangente, com visão de longo prazo, do que tópica, localizada nas estimulações de momento e próximas. Isso porque se tem observado, ao longo da história de nossa educação, que não se tem promovido a melhoria da qualidade do ensino por meio de ações que privilegiaram ora a melhoria de metodologia do ensino, ora o domínio de conteúdo pelos professores e sua capacitação em sentido mais amplo, ora a melhoria das condições físicas e materiais da escola. Qualquer ação isolada tem demonstrado resultar em mero paliativo aos problemas enfrentados, e a falta de articulação entre eles explicaria casos de fracasso e falta de eficácia na efetivação de esforços e despesas para melhorar o ensino, dispendidos pelos sistemas de ensino. (LUCK, 2011)

Para que o professor possa utilizar a teoria aprendida para embasar a sua prática, refletindo posteriormente sobre a sua atuação parta embasá-lo novamente na teoria aprendida, em um movimento dialético ascendente, ele precisa de uma formação continuada que o capacite a fazer isto. Como diz Veiga:


A formação continuada é um direito de todos os profissionais que trabalham na escola, uma vez que não só ela possibilita a progressão funcional baseada na titulação, na qualificação e na competência dos profissionais, mas também propicia, fundamentalmente, o desenvolvimento profissional dos professores articulado com as escolas e seus projetos. (VEIGA, 2002).

A formação continuada do professor é tanto uma necessidade para que possa trabalhar melhor, como um direito garantido em lei, como apontada no documento do MEC Ensino Fundamental de nove anos: passo a passo do processo de implantação:

Em relação à formação de professores, lembramos o estabelecido no artigo 67 da LDB 9.394/96, os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público: II – aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim (BRASIL, 2009, p. 17).

Frisando a questão da formação docente, por mais que o professor tenha tido uma boa formação inicial, ela deve continuar se atualizando ao longo de sua vida profissional por meios de cursos de atualização. A formação não deve ser só de iniciativa do professor, mas também dos órgãos gerenciais da educação, pois como consta no documento do MEC Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações gerais “[...] Promover a formação continuada e coletiva é uma atitude gerencial indispensável para o desenvolvimento de um trabalho pedagógico qualitativo que efetivamente promova a aprendizagem dos alunos.” (BRASIL, 2004, p. 26). A necessidade de oferta de formação continuada aos profissionais da educação se acentua em um momento como este, em que se expande o Ensino Fundamental.

A melhoria da qualidade da formação profissional e a valorização do trabalho pedagógico requerem a articulação entre instituições formadoras, no caso as instituições de ensino superior e a Escola Normal, e as agências empregadoras, ou seja, a própria rede de ensino. A formação profissional implica, também, a indissociabilidade entre a formação inicial e a formação continuada. (VEIGA, 2002).

No contexto de ampliação do Ensino Fundamental, onde a classe de primeiro ano deve ser uma transição da educação Infantil para o Ensino Fundamental (GOULART, 2006; KRAMER, 2006), é um engano achar que o professor por ter estudado em sua graduação a teoria de como trabalhar com a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, e por já está em exercício de sua profissão trabalhando com uma modalidade de ensino ou com as duas, saberá sem ajuda adequar um conteúdo curricular e uma forma de ensinar sem que receba preparo específico para isso, porque, como consta no documento do MEC Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a inclusão das crianças de seis anos de idade:

“O/a professor(a) planeja seu curso, levando em conta o plano/projeto da escola e as crianças concretas de sua turma: seus conhecimentos, interesses, necessidades. Considera ainda as condições reais de seu trabalho, sua trajetória profissional, bem como os objetivos pedagógicos para os estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental.” (NERY, 2006, p.113).

Como na primeira série do Ensino Fundamental de nove anos há crianças menores que as tradicionais de sete anos, como diz outro documento do MEC Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações gerais “[...] é essencial assegurar ao professor programas de formação continuada, privilegiando a especificidade do exercício docente em turmas que atendem a crianças de seis anos [...]” (BRASIL, 2004, p. 25).


Sem uma formação específica, o professor enfrentará dificuldades em lidar com crianças menores, que necessitam de um trabalho diferenciado, pois muitos depois de formados optaram em atuar ou na Educação Infantil ou no Ensino Fundamental, por mais que sua formação os habilite trabalhar nas duas fases da educação básica. Sobe esta formação do professor do Ensino Fundamental de maior duração, está escrito no documento do MEC Ensino Fundamental de nove anos: Passo a passo do processo de implantação:
Professores admitidos inicialmente para trabalhar na Educação Infantil podem ser remanejados para o Ensino Fundamental?

Este remanejamento depende de legislação e normas vigentes no Plano de Carreira de cada sistema de ensino. Algumas leis estabelecem a mesma carreira e concurso para atuação tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental; outras, no entanto, definem carreira e concurso com atuações distintas, ou seja, específicas para a atuação na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. (BRASIL, 2009, p. 22).

Aumentar a carga do Ensino Fundamental sem preparar os professores para atuarem nela, deixando a cargo deles e da escola fazerem o que acham que imaginam ser o certo não é dar autonomia escola, mas configura-se em descaso e violência com toda a comunidade escolar, principalmente com os professores e crianças envolvidas. O CNE/ Resolução nº 4 de 13 de julho de 2010, Art. 57 traz que:


§ 1o A valorização do profissional da educação escolar vincula-se a obrigatoriedade da garantia de qualidade e ambas se associam a exigência de programas de formação inicial e continuada de docentes e não docentes, no contexto do conjunto de múltiplas atribuições definidas para os sistemas educativos, em que se inscrevem as funções do professor [...]
Art. 58. A formação inicial, nos cursos de licenciatura, não esgota o desenvolvimento dos conhecimentos, saberes e habilidades referidas, razão pela qual um programa de formação continuada dos profissionais da educação será contemplado no projeto politico-pedagógico.

A formação continuada dá mais segurança para o professor desempenhar o seu papel profissional, e no contexto de aumento da duração do Ensino Fundamental, com um primeiro ano composta por crianças de seis anos, a formação continuada do professor e dos outros profissionais da educação que atuam na escola, seria uma maneira de deixar o ambiente escolar menos tenso, por conta de não se saber como trabalhar exatamente com estas crianças de seis anos. Segundo Luck:

O clima é, pois, identificável pelas representações que estas pessoas fazem sobre tudo o que compõe o seu ambiente de vivência e que lhe provoca estimulações, que passam por suas percepções, motivando seu posicionamento a respeito, assumido a partir dos significados construídos em relação a esse conjunto de coisas. (LUCK, 2010, p. 65).

A formação continuada, principalmente do professor que irá lidar com as crianças de seis anos, mas também de todos os profissionais da educação, é uma premissa básica para que se consiga os resultados esperados com a implantação da Lei nº 11.274/06.


ADEQUAÇÃO DOS PRÉDIOS ESCOLARES

Para receber adequadamente as crianças de seis anos que ingressam na primeira série do Ensino Fundamental de nove anos, deve haver uma adaptação de todo o prédio escolar das escolas de Ensino Fundamental, tornando-as mais parecidas com as de Educação Infantil. As mudanças deveriam começar pelo mobiliário escolar, disponibilizando as crianças por exemplo, mesas e cadeiras semelhantes as existentes em salas de educação infantil, próprias para a sua estatura.


Segundo Silva e Santos, fazer com que uma criança fique sentada por quatro ou cinco horas sentada em uma cadeira feita para alguém muito maior do que ela, traz muito desconforto à criança, ocasionando até mesmo dores físicas e tudo isso atrapalha em seu aprendizado:
“...tal situação poderá induzir a posturas corporais inadequadas que desencadearão acometimentos físicos e posturais a curto, médio e longo prazo. Além do mais, desconfortos podem gerar desatenção e desinteresse pelas atividades pedagógicas, prejudicando não somente a saúde como também a aprendizagem dos alunos...” (SILVA e SANTOS, 2006, p. 1).


Além do mobiliário adequado, é necessário se instalar parquinhos nas escolas para que as crianças possam brincar, pois brincar é algo primordial para o desenvolvimento biológico, social, afetivo e cognitivo das crianças pequenas. A existência de parquinho que é comum nas escola de Educação Infantil, mas é raro nas escolas de Ensino Fundamental. Também devem ser adaptados para o uso de crianças menores os bebedouros nas escolas, que não muito altos para as crianças de seis anos, os vasos sanitários nos banheiros, entre outros.


Desde o começo das discussões sobre a ampliação do Ensino Fundamental, com as crianças menores ingressando nas escolas de Ensino Fundamental, havia muitas dúvidas dos profissionais da educação em como atender estas crianças menores. Esta dúvidas dos profissionais da educação aparecem no documento Ensino Fundamental de nove anos: Passo a passo do processo de implantação, onde há a seguinte pergunta:

Pode-se utilizar o espaço de instituições de educação infantil para atender as crianças do Ensino Fundamental de nove anos?


Não é recomendável que se utilizem instalações de instituições de Educação Infantil para o atendimento do Ensino Fundamental sem a devida adaptação. Esta deverá sempre ser orientada pelos interesses do desenvolvimento das crianças, por faixa etária.” (BRASIL, 2006, p. 22).

Levando em consideração o que Kramer e Goulart trazem em suas discursões, de que a primeira série do Ensino Fundamental deva ser uma transição entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, vemos como é importante se adequar tanto seu conteúdo pedagógico como adequar a estrutura física da escola para receber estas crianças menores, pois a escola precisa ser um lugar feito para receber as crianças pelo o que elas são agora, não pelo que serão daqui a um ano ou mais.


O ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS NA CIDADE DE SÃO PAULO

No corpo da Lei nº 9394/96 está determinado:

Art.11 Os Municípios incumbir-se ao de:
V – Oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Por conta da determinação da Lei, o Ensino Fundamental na cidade de São Paulo, que é um centro comercial muito importante para todo o Brasil, sendo uma referência para muitas outras cidades, está sendo gerida pela Secretaria Municipal de Educação (SME). No portal digital da Secretaria, a dimensão da Rede é evidenciada:

A rede municipal de ensino da cidade de São Paulo é o maior sistema do país, com quase 1 milhão de alunos, 9,2% dos quase 10,8 milhões de habitantes da cidade. Somados aos pais e familiares, envolve quase 5 milhões de pessoas, ultrapassando, e muito, a população da maioria das cidades brasileiras. (SÃO PAULO/SME, 2010).

Segundo dados do SINPEEM, atualizados em fevereiro de 2011, a Rede Municipal de Ensino é composta por 1.432 escolas, sendo elas assim distribuídas:


- 356 Centros de Educação Infantil;
- 538 Escolas Municipais de Ensino Fundamental;
- 508 Escolas Municipais de Educação Infantil;
- 08 Escolas Municipais de Ensino Fundamental e Médio;
- 06 Escolas Municipais de Educação Especial;
- 14 Centros Integrados de Educação de Jovens e Adultos;
- 02 Centros Municipais de Capacitação e Treinamento.

Para auxiliar a SME na administração de todos esses estabelecimentos de ensino, existem treze DREs (Diretorias Regionais de Ensino), localizadas nas regiões de Butantã, Campo Limpo, Capela do Socorro, Freguesia do Ó, Brasilândia, Guaianazes, Ipiranga, Itaquera, Jaçanã, Tremembé, Penha, Pirituba, Santo Amaro, São Mateus, São Miguel Paulista.

Nesta Cadeia de estabelecimentos de ensino, a SME dispõe de mais de noventa e dois mil servidores públicos, que vão desde apoiadores da educação aos educadores, que atendem a um total de 990.427 alunos, segundo dados da SME, no ano de 2011.

Com a aprovação da Lei nº 11.274/06, as escolas tiveram quatro anos para se adaptar fisicamente para receber as crianças de seis anos que chegariam. Deveriam ser instalados, por exemplo, os parquinhos nos estabelecimentos escolares que não os tinham. Era preciso também ser feita uma adequação do conteúdo pedagógico para atender as crianças que chegariam muito pequenas ao primeiro ano do Ensino Fundamental, além de, por meio de formação continuada, capacitar os professores para trabalharem com elas.

Essa tão necessária adaptação, que tornaria a primeira série do Ensino Fundamental de nove anos uma transição entre a Educação Infantil e a etapa seguinte não ocorreu nas escolas municipais da cidade de São Paulo. Foram exceções as escolas onde ela aconteceu e, quando isso aconteceu, foi por conta dos profissionais da educação que atuavam na unidade escolar, não por mediação da SME. Esta afirmativa pode ser sustentada no que foi por mim vivenciado nos anos de 2009 e 2010, como estagiaria.

Na sequencia, pontuamos algumas ações legais do Estado de São, em prol da ampliação do Ensino Fundamental de 8 anos para 9 anos.

Desde que começaram as discussões sobre a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, antes mesmo da Lei nº 11.274/06 ser sancionada, tanto o Governo como representantes da sociedade civil e movimentos sociais discutiram como a ampliação deveria acontecer. Dos documentos produzidos pelo MEC, um deles traz os resultados das discussões efetuadas até o primeiro semestre de 2004.

A ampliação do Ensino Fundamental para nove anos vem sendo discutida pela Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC) com os sistemas de ensino. Prevista na Lei nº 9.394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), e em uma das metas do Ensino Fundamental no Plano Nacional de Educação (PNE), esta ampliação objetiva que todas as crianças de seis anos, sem distinção de classe, sejam matriculadas na escola.

As contribuições dos participantes nos encontros regionais foram essenciais para a elaboração do documento Ensino Fundamental de Nove Anos – Orientações Gerais, ao qual este relatório está anexado. Esta publicação, elaborada pela SEB/MEC, é referência nacional para as questões pedagógicas, administrativas e de avaliação no que se refere à inclusão das crianças de seis anos no Ensino Fundamental (BRASIL, 2004, p. 02).

No ano de 2006, assim que a Lei nº 11.274/06 foi aprovada, começou no Estado de São Paulo o debate sobre como seria este ensino fundamental com um ano a mais, com o envolvimento do Governo do Estado de São Paulo e segmentos da sociedade civil, particularmente os sindicatos que representavam os profissionais da educação, envolvidos diretamente neste processo. As discussões do Conselho Estadual de Educação (CEE), que foram oficializadas em forma de deliberações e orientações, expressam com clareza a necessidade de se adaptarem os prédios escolares onde seriam ofertados o ensino fundamental de nove anos, assim como o conteúdo pedagógico que seria ministrado às crianças menores que chegariam mais cedo à escola. O CEE também falava em oferecer formação aos professores. Segundo a Deliberação do CEE nº 61/2006:

Art. 6º - A implantação do Ensino Fundamental de nove anos implicará, dentre outras medidas: I - a reorganização curricular e pedagógica de toda a estrutura desse nível de ensino, materiais didáticos, mobiliários, equipamentos, recursos tecnológicos e acervos bibliográficos;
II - a organização dos tempos e no redimensionamento dos espaços e ambientes escolares, em especial, àqueles que, sendo compatíveis para crianças de seis anos, garantam-lhes continuidade do contexto sócio afetivo e de aprendizagens anteriormente vivenciadas;
VI - o estabelecimento de programas de formação continuada de professores e demais profissionais, privilegiando a especificidade do docente que irá atender os alunos nos anos iniciais.

Também foi aprovada, no ano de 2006, a Indicação CEE nº 63/2006, descrevendo como deveria ser a implantação do Ensino Fundamental de nove anos na cidade de São Paulo:

[...] está prevista a discussão de diferentes concepções pedagógicas que permeiam o currículo, para que a expansão do Ensino Fundamental não se reduza à criação de uma série a mais com as mesmas características da atual 1ª série e a educação infantil tenha preservada a sua identidade pedagógica. (SÃO PAULO, 2006).

Tanto a Deliberação CEE nº 61/2006 como a Indicação CEE nº 63/2006, são incisivas na questão da necessária adaptação a ser feita nas escolas, para receber as crianças de seis anos que começariam a cursar o ensino fundamental, além da adequada preparação dos professores.


No ano de 2008, uma nova Deliberação e Indicação revogam o que havia sido decidido no ano de 2006, adotando outra maneira de proceder em relação à implantação do ensino fundamental de nove anos. Elas deixam de frisar a necessidade da adequação tanto física dos prédios escolares, como do conteúdo pedagógico a ser ministrado às crianças menores, não dando ênfase à formação dos professores que atenderiam a primeira série do novo Ensino Fundamental. Consta na Deliberação CEE nº 73/2008:

Art. 5º - No ano letivo de 2009, a 3ª fase de Pré-Escola em funcionamento nas redes municipais de ensino é considerada, para todos os fins, como equivalente ao 1º Ano do Ensino Fundamental.
§ 2º - As redes municipais de ensino devem proceder aos ajustes de infra-estrutura e de pessoal necessários à implementação do indicado neste artigo.

Ao compararmos as duas Deliberações, pode-se notar que houve uma “flexibilização” da necessidade de adequação dessa etapa de ensino para atender as crianças menores, o que se evidencia na Indicação CEE nº 73/2008:

1.6. IV. A Concepção Pedagógica correspondente às 8 séries do antigo Ensino Fundamental de 8 anos - 1ª a 8ª série, não seria necessariamente alterada pela adoção do seu correspondente no Ensino Fundamental de 9 Anos.

Este princípio define que o conjunto composto por: projetos pedagógicos, conteúdos, espaço físico, alocação de docentes, material didático, etc..., não sofre, obrigatoriamente, nenhuma alteração significativa por conta dos ajustes à nova situação

1.7 As normas, ora introduzidas, prevêm a revogação da Deliberação CEE nº 61/2006, no entanto, na elaboração da Proposta Pedagógica, a equipe escolar deve especialmente atentar para as necessidades:
I - da articulação entre as demandas e as características da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, procurando prever mecanismos de interação entre a família, a escola e a comunidade, de modo que não haja prejuízo da oferta de Educação Infantil e seja preservada sua identidade pedagógica. (SÃO PAULO, 2008).



Para que a ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos se reverta em um melhor aproveitamento acadêmico pelo aluno, é necessário que sejam levados a termo alguns procedimentos, como adaptar o conteúdo pedagógico e tempos escolares para a realidade das crianças de seis anos, dar formação continuada para os profissionais da educação, principalmente os professores para que consigam trabalhar da forma correta com as crianças menores que chegam a escola, além de se adequar os prédios escolares para receber as crianças de seis anos, equipando as unidades escolares com moveis apropriados a estas crianças menores, se instalando parquinhos, entre outros (BRASIL, 2006).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concordo com a atitude do MEC, que ampliou a duração da educação básica aumentando um ano no Ensino Fundamental, passando-o de oito para nove anos com crianças de seis anos ingressando na escola, por meio da Lei nº 11.274/06 que entrou em vigor no ano de 2010. Tal medida foi tomada com o intuito de melhorar o desempenho acadêmico dos alunos, especialmente dos alunos oriundos de camadas economicamente desfavorecidas da população, que muitas vezes só começavam a frequentar a escola aos sete anos, quando se torna tanto obrigatório seu ingresso na escola, como ao Estado lhe fornecer uma vaga na rede de Ensino para que possa estudar. Por conta desta realidade vivida, ao entrar um ano antes no Ensino Fundamental, os alunos acabam tendo mais tempo para a alfabetização e o letramento. A adoção de uma educação básica com uma maior quantidade de anos de duração, já acontece em muitos países do mundo, como cita os autores Cabral (2006), Batista (2006) e Zan (2005), estando o Brasil atrasado em relação a outros países, que possuem uma escolarização básica de maior duração que a brasileira, e em exames educacionais internacionais como o PISA, que medem os conhecimentos dos alunos, esses países conseguem um melhor resultado que o Brasil.


É necessário pontuarmos que a extensão do Ensino Fundamental, por si só, não garante um melhor aprendizado dos alunos, se não for acompanhada de medidas que confiram qualidade educacional ao tempo que o aluno permanece na escola, como é apontado pelo MEC e os autores estudados como KRAMER (2006), GOULART (2006), BORBA (2006), NASCIMENTO (2006), etc. É preciso ser feita uma adequação do conteúdo pedagógico do que é ensinado no Ensino Fundamental, pois ao ter mudada a sua configuração de oito para nove anos, o currículo precisa ser revisto. Faz-se necessário adequar os prédios escolares para receber crianças menores, instalando parquinhos onde não os há, pois as crianças pequenas precisam brincar, se adquir móveis apropriados ao tamanho das crianças, como bebedouros e carteiras, como diz SILVA e Santos (2006) , além de preparar os profissionais da educação para trabalharem com elas, por meio da formação continuada que é um direito destes profissionais. Tal formação é imprescindível para o professor que trabalhará com as crianças de seis anos que ingressam no primeiro ano do Ensino Fundamental, pois elas precisam encontrar neste primeiro ano uma sala de aula, que seja uma mistura entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental (GOULART (2006) E KRAMER (2006) e se isso não acontece é um desrespeito tanto ao profissional de educação, que não recebe a preparação devida para exercer seu trabalho, como com a criança, que é submetida à violência de ter que submeter a um currículo inadequado a seu desenvolvimento biológico, cognitivo, emocional e social, em prédios feitos para crianças maiores, que elas ainda não são.

O MEC começou as discursões sobre o a implantação de um ano a mais no Ensino Fundamental em 2003, resultando destas conversas relatórios e documentos – inclusive um livro texto – indicando quais os caminhos que deveriam ser observados para adequada implantação deste ano a mais de ensino ocorresse de forma adequada, porém estas observações não chegaram a base, ao chão da escola, e no ano da implantação da Lei nº 11.274/2006, as escolas não sabiam o que fazer. Na cidade de São Paulo, por exemplo, um centro urbano rico e muito importante para o Brasil, a implantação do Ensino Fundamental de nove anos não aconteceu da forma preconizada pelo MEC, que orientou os aspectos que deveriam ser observados na implantação da ampliação do Ensino Fundamental. No ano de 2006, ano de aprovação da LEI n] 11.274/2006, começaram no Estado de São Paulo discursões puxadas pelo CEE junto à profissionais da educação, estudiosos do campo educacional e sociedade civil, de como deveria ser feito a implantação do Ensino Fundamental de nove anos no Estado, e o que deveria ser feito foi fixado pela Deliberação do CEE nº 61/2006 e outras indicações. Tais orientações feitas pelo CEE seguiam a linha do que foi dito pelo MEC, frisando a necessidade de serem feitas ações como a formação dos profissionais da educação, e adequação dos conteúdos pedagógicos e prédios escolares. Apesar do apontamento da necessidade de se mexer nas escolas e em sua estrutura de funcionamento para trabalhar com as crianças menores, principalmente a de seis anos que ingressavam no primeiro ano, tais ações não aconteceram de fato.

Por mais que a escola e a comunidade que a envolve devam ser reflexivas, possuindo autonomia para encontrarem as melhores soluções para seus problemas, neste caso deixar que a escola e a comunidade escolar encontrem sozinhas as soluções para a adequação pedagógica e estrutural dos prédios escolares, não pode ser caracterizada como uma gestão democrática por parte do governo, e sim como descaso com a educação e as pessoas com elas envolvidas. Se isso acontece em uma cidade tão importante para o Brasil como São Paulo, que é o centro econômico que está na mídia todos os dias, pode-se imaginar como não foi a implantação em outros Estados do Brasil, em cidades pobres onde as escolas se encontram em situação precária, e não há presença da mídia para mostrar o que acontece?

Estudar como foi a implantação do Ensino Fundamental de nove anos é importante para todos os brasileiros, pois o processo revela como está sendo tratada a educação em nosso país, e ao analisarmos os pontos positivos e negativos da implantação deste novo Ensino Fundamental, podemos corrigir o que está errado e investir no que está certo, melhorando a qualidade do ensino ofertado no país, tornando-o de fato de qualidade e acessível a todos.

Não adianta somente se ampliar os anos de escolarização, se não houver um maior investimento na área educacional, garantindo que haja vagas em escolas e que as mesmas sejam adequadas a seus alunos. É preciso se dar condições para que as crianças frequentem a escola na idade certa, acabando com a evasão escolar e garantido acesso à educação de qualidade e gratuita até a Educação Superior. Ao professor deve ser dado uma excelente formação inicial, devendo a mesma ter continuidade durante o exercício do magistério. Ele deve ter a seu dispor bons materiais pedagógicos para utilizar em suas aulas, ter novamente sua profissão valorizada como um dia já foi, onde ser professor causava prestigio social tamanha a relevância do seu oficio, recebendo um salário adequado para que não precisasse trabalhar em vários turnos por dia, ficando sem tempo de preparar suas aulas de forma adequada, e mesmo ter uma vida saudável, com tempo para descanso e lazer. Esse reconhecimento do valor de seu trabalho deve ser extendido também a todos os profissionais da educação, principalmente os que atuam dentro da escola. Esses profissionais que recebem a designação de quadro de apoio a educação, também são educadores dentro do ambiente escolar, e precisam ter a relevância de seu papel no espaço escolar reconhecido e respeitado.

Educação acesso à educação é um direito de todos os cidadãos e dever do Estado.

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