quinta-feira, 1 de março de 2012

As sutilizas do racismo


Acontecerá agora no mês de março o julgamento pelo CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitário), se houve ou não racismo no anúncio comercial feito para o azeite Gallo pela agência AlmapBBDO. No anúncio está escrito: “O nosso azeite é rico. O vidro escuro é o segurança.”

O anúncio que começou a ser vinculado em outubro do ano passado tem dividido opiniões, e há pessoas que pedem que o mesmo deixe de ser veiculado por ser racista, a outras que acham que essa atitude é exagerada, advinda de pessoas que querem encontrar racismo onde não há.

Em minha opinião o anúncio tem um tom racista sim, mesmo que não intencional. O anúncio não fala que o vidro escuro é a segurança de conservação das propriedades do azeite, como aparece em outro anúncio do produto, mas diz que “o vidro escuro é o segurança”. Essa afirmação me traz a mente à associação de vidro escuro com um homem negro, e não com um homem vestido de preto como normalmente se vestem os seguranças, e que seria "o escuro" a qual o anúncio se refere, segundo o argumento de quem diz que não há racismo na propaganda.

Para mim o anúncio mostra algo que acontece em nossa sociedade, que é encontrarmos pessoas negras em posições subalternas, a servir as pessoas brancas. O anúncio traz a a imagem do homem branco e rico, claro, sendo protegido por um segurança negro, escuro. O patrão branco e o empregado negro, tal qual vemos nas novelas que passam na TV, e na vida real também. Exceções a esta regra são raras.

Essa visão do negro como empregado do branco que começou na época escravidão, se perpetuou porque depois de libertos os negros foram jogados à própria sorte, sem trabalho pois os brancos imigrantes que eram assalariados acupavam seu lugar nas lavouras, e para sobreviver tiveram que desempenhar as piores funções, "inferiores" as que os brancos desempenhavam. Até hoje a condição de vida entre brancos e negros é desigual, e uma pessoas branca mesmo que pobre tem mais chances de sucesso do que uma pessoa negra. A consequência desta desigualdade é facilmente percebida quando comparamos coisas "evidentes", como qual a cor das pessoas que lotam as cadeias (negros em sua grande maioria) e das pessoas que chegam ao ensino superior no Brasil (mais de 90% são brancos).

Hoje ainda temos poucas pessoas negras em cargos de chefia, e isso fica mais aberrante se considerarmos o Brasil como país negro que é. Para algumas pessoas isto é uma "seleção natural" e ocorre devido a mérito, como se uma maior “concentração de melanina na pele” fizesse algumas pessoas menos competentes. Considerar a questão somente por mérito mascara que isso ocorre por estarmos em uma sociedade racista, onde ser branco é sinônimo de qualidade, competência, honestidade e beleza, e na hora da contratação de um funcionário ou na hora da "promoção" o ideal de sucesso como sinônimo de cor branca, infelizmente é levado em conta por muitas empresas, mesmo que de forma inconsciente. De fato, frequentemente vemos pessoas negras em cargos como segurança de brancos, como lembra o anuncio do azeite, mas não podemos aceitar que isso seja colocado como uma vocação natural das pessoas negras ou “escuras”, que por natureza nasceram para servir as pessoas brancas ou claras, principalmente quando são ricas

Mesmo sem querer ser racista, pois acredito que essa não foi a intenção da agência de propaganda, ela colocou em seu anúncio uma situação de racismo que existe na nossa sociedade, por isso tanto alvoroço de pessoas que se sentiram ofendidas com sua veiculação. Manifestações racistas mesmo que sutis ou não intencionais precisam ser combatidas, senão nunca exterminaremos esta praga que subjuga as pessoas pela cor de sua pele. E no final das contas, somos todos seres humanos.

Se sou radical e interpreto mau o fato, me desculpe. Só brigo para que tenhamos um mundo mais justo.

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